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E o amor, por sua vez, amplia a ilusão da unidade. E na maioria das vezes ele é abortado e
não passa de insignificâncias. O medo de refazer a dois ou a dez o caminho tão igual e tão
conhecido do isolamento ameaça com seu acorde gelado as sinfonias amorosas. O que nos
leva ao desespero não é a imensidão dos nossos desejos insatisfeitos mas a paixão que
nasce confrontada com o seu vazio. O desejo insaciável de conhecer apaixonadamente
tantas garotas encantadoras nasce na angústia e no medo de amar: receamos de tal modo
não escaparmos nunca dos encontros objetos.

A aurora em que os abraços se soltam é semelhante à aurora em que morrem os
revolucionários sem revolução. O isolamento a dois não resiste ao isolamento de todos.
O prazer desfaz-se prematuramente, os amantes reencontram-se nus no mundo, os seus gestos se tornam subitamente ridículos e sem força. Não há amor possível em um mundo infeliz. O barco do amor se quebra contra o recife do cotidiano.

Estás pronto para destruir os recifes do velho mundo antes que eles afundem teus desejos?
Falta aos amantes amar o seu prazer com mais consequência e poesia. Conta-se que o
príncipe Shekour se apoderou de uma cidade e a ofereceu à sua favorita pelo preço de um
sorriso. Poucos de nós se apaixonam pelo prazer de amar sem reservas, com paixão
suficiente para oferecer ao amor o leito suntuoso de uma revolução.